Entrevistas

Entrevista com a Procuradora de Justiça Sandra Cal Oliveira

Entrevista com a Procuradora de Justiça Sandra Cal Oliveira, Titular da 1ª Câmara Cível e Coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça Cível, CaoCível.

 

AIDC: Há quanto tempo está no Ministério Público? Como surgiu a vontade de ingressar na instituição?

SC: Minha posse foi no dia 15 de março de 1983 e essa vontade surgiu desde que eu resolvi prestar o vestibular para Direito. Eu nunca fui advogada um dia sequer, apesar de eu ter trabalhado no Tribunal de Justiça como escrevente juramentada por três anos. No dia em passei no vestibular, não quis ser outra coisa a não ser Promotora de Justiça.

AIDC: Quais são as lembranças da época de Promotora? Quais foram as comarcas que a senhora já passou?

SC: Eu continuo Promotora, apenas atingi o ápice na minha carreira. Passei pela Comarca de Barcelos e lá tinha uma carência de tudo. O hospital não era dotado de centro cirúrgico, não havia supermercado, as pessoas tinham que esperar mês e mês aqueles navios da Copal passarem no município e, se alimentavam de enlatados. Não existia farmácia, os remédios mais simples eram vendidos em mercados. Quando aterrissei em Barcelos, fiquei pensando comigo mesmo, “será que eu to fazendo a coisa certa?”. Era a primeira vez que estava me separando da minha família, deixando tudo para trás. Mas decidi ficar e enfrentar o que vinha pela frente, pois o MP tem a função de orientar a sociedade para ter uma vida melhor. Depois de dois anos e meio fui para Manacapuru, onde foi mais difícil. Fiquei sem moradia depois de um ano e não havia casa disponíveis para alugar e, apesar de ser uma comarca próxima ela se tornou mais difícil pra mim. Então tinha que sair daqui (Manaus) às quatro da manhã pra pegar a balsa às cinco, passava o dia lá (Manacapuru) e voltava às cinco da tarde e chegava em Manaus às sete da noite. Na época, os hotéis que tinham na comarca eram muito caros, a diária, mas quando tinha condições e em situações mais sérias eu ficava no hotel. E até a luz do quarto era fraca, atrapalhando as leituras do processo.

AIDC: Na sua opinião, qual é a maior dificuldade de um Promotor que trabalha no interior?

SC- Na minha época, a dificuldade era muito grande. Apesar de muito nova, fiquei três meses no interior morando na missão salesiana com as irmãs. Enfrentei a questão da moradia, que hoje já é difícil, imagine naquela época. A gente não tinha acesso nem a rádio,e nem televisão. Levava aquelas fitas gravadas com música, porque era a única distração que eu tinha. A gente não tinha computadores, o material utilizado era comprado com nossos recursos. Eu não saía da minha comarca, vinha a Manaus de três em três meses, isso quando era devidamente autorizada pelo Procurador Geral. Então, eu morava na comarca e muitas vezes ficava como autoridade máxima.

AIDC: Como é o trabalho da sua Procuradoria? Do que ela trata?

SC: Sou movida a desafios, pautei minha vida em me aprofundar nas coisas, em resolver os problemas. Na faculdade, eu sempre gostei muito de Penal e Processo Penal e eu tinha um professor, inclusive era membro do MP, o nosso saudoso Carlos Alberto Bandeira de Araújo, que dá nome ao nosso auditório. Por causa dele me empolguei ainda mais e quis fazer concurso para Promotor de Justiça. E foi com ele também, que me dediquei a Processo Civil. Gosto muito da minha Procuradoria e sonho com dias melhores. A nossa Procuradoria, além dos problemas do Direito de Família, envolve um leque de matérias. Nós lidamos aqui com Direito Falimentar, Tributário, Constitucional, e como não poderia deixar de ser, Civil, Processual Civil, Administrativo. É uma matéria bastante complexa porque na nossa área não podemos nos dedicar a um só caminho. O que a gente tem que ser é um bom intérprete, porque cada caso é um caso. Você procura pautar seu parecer, dentro daquilo que você acha a melhor resolução possível, tentando buscar a verdade real e que a justiça seja feita.

AIDC: E como coordenadora, qual é a maior dificuldade?

SC: A maior dificuldade que nós temos é falta de estrutura. Nós tentamos e vamos conseguir, se Deus quiser, porque é desejo do Procurador-Geral, e acredito que isso vai se concretizar, que em breve a gente tenha uma boa estrutura. Estrutura de espaço, de técnico-jurídicos para tentar amenizar, o máximo possível, aquele desânimo dos colegas. O objetivo é dotar  cada vez mais a nossa Coordenadoria para ajudar aos colegas porque, como o nome mesmo diz somos uma "Coordenadoria de Apoio", então a gente tem que tentar resolver, amenizar os problemas dos colegas, conciliar tudo. Acredito que a união faz a força, não só da minha Coordenadoria, mas de todas as outras. Se a gente se unir, a gente consegue.

AIDC: Na sua opinião, o trabalho do MP ainda é precário ou já se tem uma evolução?

SC: O Ministério Público tem demonstrado que está avançando ao longo desses anos e o importante é que a gente continue avançando, um passo de cada vez para que não haja tropeços, mas sempre no sentido de cada vez melhorar, e isso eu sinto aqui na instituição. Quando olho pra trás e lembro que nem gabinete nós tínhamos, nem computador e material, penso que avançamos muito. É lógico que com o passar dos anos a gente tem que se atualizar. Temos que nos aperfeiçoar como profissionais e buscar os melhores caminhos para que consigamos nossos objetivos. Buscar a justiça social, ter um suporte pra poder ajudar os outros.,enfim. Acredito que a gente esteja caminhando para dotar as nossas Promotorias, Procuradorias de forma geral, de forma a melhorar sempre . Acho que devem existir reuniões entre nós Procuradores, a fim de que possamos também resolver ou amenizar os problemas dos Promotores.

AIDC: Em média, quantos processos chegam a sua Procuradoria? Existe algum pendente?

SC: Depende. Há meses em que a gente recebe 40, em outros, 20.  Mas a nossa produtividade pode ser vista pelo site do MP .O importante é que sempre tentamos deixar nosso trabalho em dia.  Com certeza, não tem nenhum processo pendente.

AIDC: Qual é a sua avaliação da gestão atual?

SC: Acredito que há muita força de vontade, muito empenho de toda a equipe. Não só do Doutor Francisco Cruz, da equipe também em procurar resolver esses problemas, que ele sabe que existem. Agora, acredito que ele vai conseguir.

 

Eu continuo Promotora, porque continuo promovendo a Justiça, em um país tão carente de Justiça, tão carente de tudo. A gente vê pessoas que necessitam realmente de esclarecimento, vítimas do próprio drama familiar.”

Sandra Cal, Procuradora de Justiça