Entrevistas

Promotor de Justiça Flávio Mota Morais Silveira concede entrevista ao Portal do MP-AM




Assessoria de Imprensa –  Fale um pouco sobre a sua trajetória jurídica e como surgiu essa vontade de atuar nessa área?

Quando chegou a época do vestibular, estava na dúvida. Não sabia se me inscrevia para História, Psicologia ou Direito, porém estava mais inclinado para a área jurídica. Fiz um teste vocacional e o teste somente confirmou o que eu realmente queria, que era fazer Direito. Prestei vestibular para a UFAM em 2002 e não fui aprovado na primeira tentativa. Logrei aprovação no ano seguinte, tendo ingressado na Faculdade do Largo dos Remédios no ano de 2003 e colado grau em 2008.

Alguns fatos marcaram minha passagem pelo Curso de Direito que reputo determinantes para o meu ingresso no Ministério Público. Um deles foi ter tido excelentes professores que são ou foram membros do Parquet, tais como o Prof. Nasser Abrahim Nasser Neto e o Prof. Antônio Raimundo Barros de Carvalho, os quais me estimularam a seguir a carreira ministerial e sempre torceram pela minha aprovação no certame. Outro fato digno de nota foi a equipe da qual fiz parte ter se sagrado vencedora da IV edição do tradicional Concurso de Júri Simulado promovido pelo MP-AM. Nossa equipe foi orientada pelo Prof. Nasser e pudemos atuar em processos reais, ora na acusação, ora na defesa, e pude ver a dimensão da atuação do Ministério Público no Tribunal do Júri, que é empolgante, apaixonante.

Ao lado de minhas atividades acadêmicas, fui aprovado no concurso do Tribunal de Justiça do Amazonas para o cargo de assistente judiciário. Lá tive a oportunidade de assessorar, dentre outros magistrados, o então Juiz de Direito, hoje desembargador, Mauro Bessa e a desembargadora Graça Salgado. Com o Dr. Mauro trabalhei na 1° Vara da Fazenda Pública Estadual e pude ver a atuação combativa do Ministério Público na defesa do patrimônio público, ao ajuizar ações de improbidade administrativa, e na defesa dos direitos transindividuais, por meio de ações civis públicas. Esse é um aspecto peculiar da atuação ministerial. Por seu turno, fui assessor da desembargadora Encarnação na 1ª Câmara Criminal, e pude a observar a extensa atuação do Ministério Público no âmbito criminal nas Varas Criminais especializadas e nas Varas Criminais comuns. O fato de ter trabalhado com esses magistrados, elaborando minutas de decisões, sentenças e votos me trouxe um conhecimento jurídico que certamente não teria se estivesse apenas estudando; me trouxe também uma bagagem e segurança para pautar minha atuação, agora na condição de Promotor de Justiça.

 

Em que ano o senhor ingressou no MP?

Fui nomeado em 31 de janeiro de 2012, portanto há aproximadamente um ano. O edital do concurso foi lançado em 2007, ainda estava na faculdade enquanto me submetia às provas. Para superar a “quarentena de entrada” (três anos de atividade jurídica) contei com a sorte, pois as nomeações do nosso concurso demoraram a sair. Hoje o Conselho Nacional do Ministério Público possui resolução determinando que os três anos de atividade jurídica devem ser comprovados na data da posse.

 

Quais as Comarcas pelas quais já passou?

Somente Eirunepé, comarca de minha lotação inicial. Em Manaus conheci várias Promotorias de Justiça durante o Estágio de Adaptação e já fui designado para responder perante uma Promotoria com atuação em Vara Criminal.

 

Quais os casos mais frequentes que passam pela sua Comarca?

Casos envolvendo Direito das Famílias e o Direito Criminal são o carro chefe da atuação ministerial no interior. Pensão alimentícia, guarda de menores, adoção fazem parte do nosso dia a dia. No âmbito criminal, há crimes mais simples, como furto, lesões corporais e crimes de menor potencial ofensivo; crimes ambientais, como transporte de madeira sem autorização e queimadas de áreas verdes; mas também há crimes graves, como homicídios, uma quantidade expressiva de crimes sexuais, notadamente o estupro de vulnerável. Aqui, e no interior de um modo geral, é “cultural” manter relações sexuais com menores de 14 anos, mas nós combatemos isso veementemente. O tráfico de drogas é uma questão a parte, pois o vício acaba gerando outros crimes, como roubo, a extorsão, violência doméstica etc. No entanto, penso que a atuação ministerial não pode se restringir a apenas esses dois ramos do direito. A tutela dos direitos coletivos faz parte de nossa agenda. Assim, a proteção ao patrimônio público, da probidade administrativa, dos direitos dos consumidores, do meio ambiente, das crianças e dos adolescentes, do direito à saúde fazem parte de nossa atuação. Para tanto nos valemos do inquérito civil e da ação civil púbica.

 

Quais os pontos positivos e as dificuldades de ser promotor no interior do Estado?

Os pontos positivos de ser Promotor de Justiça no interior é o reconhecimento, público e imediato, quando se faz um trabalho bem feito, pautado pela legalidade. Receber um elogio por ter simplesmente ter feito bem o seu trabalho não tem preço. Outro ponto curioso é a possibilidade de poder fazer a siesta após o almoço. A cidade para ao meio dia! É outro ritmo, muito diferente do estresse da capital. As dificuldades são inúmeras: a distância da família, parentes, amigos; para mim, que estou acostumado, a falta das facilidades da capital. No entanto, são dificuldades que acabam sendo contornáveis pela internet, pela TV a cabo, pelo fato da minha noiva fixar residência aqui quando casarmos. O que realmente me preocupa é a situação de abandono que o interior padece. A questão criminal, por exemplo, é um problema mais social que jurídico. Faltam espaços públicos de lazer para a juventude, não há educação de qualidade; falta emprego e renda para a população. Para se ter uma ideia, falta Juiz e Defensor Público na cidade, que é o mínimo que a Justiça necessita para funcionar. O magistrado que responde pela Comarca é titular de uma Vara na Capital, e tem que se desdobrar para cuidar das urgências da cidade.

No entanto, sou otimista e a tendência sempre é que as coisas melhorem. Hoje mesmo (16/01/2013)está sendo instalado aqui na Comarca o PROJUD, que é a virtualização dos processos em trâmite no Cartório Judicial.

 

No seu ponto de vista, quais as contribuições do Ministério Público Estadual para a sociedade amazonense?

Sem dúvida, é a defesa da legalidade. Quando alguém, seja rico ou pobre, atua em desconformidade com a lei o Ministério Público atua buscando a sua responsabilização, o que não inibe a nossa atuação preventiva, ora advertindo, ora explicando os direitos básicos dos cidadãos. Orientado por esses valores, em outubro do ano passado realizamos o projeto “O MP nas Escolas”, onde demos palestras sobre direitos aos alunos do terceiro ano do ensino médio.

 

Como o senhor avalia a atual administração do Ministério Público do Amazonas?

O Dr. Francisco Cruz está fazendo uma boa gestão. Nomeou os promotores remanescentes do concurso de 2007, está em vias de começar a construção da nova sede, está dando continuidade ao projeto Sedes Próprias, há perspectiva de criação de novas Promotorias de Justiça, o que redundará em maior movimentação na carreira. Além disso, o Dr. Francisco está a par dos grandes temas que circundam o MP brasileiro, tal como o repúdio à PEC 37, a proposta de emenda à Constituição Federal que busca conferir exclusividade na investigação criminal às Polícias Civil e Federal, proibindo, via de consequência, o MP de investigar crimes.

 

Existem aspectos em que o Ministério Público deve melhorar? Se sim, quais?

Sempre se pode melhorar. A criação de vagas para Agentes Técnicos Jurídicos contemplando novas cidades do interior e o seu provimento por concursos regionalizados seria uma medida salutar para a melhor prestação do nosso serviço. Quem sairia lucrando seria a própria sociedade. Ademais, a movimentação na carreira é algo preocupante. A falta de perspectiva de promoção para a Capital fez muitos candidatos do nosso concurso optarem por não assumir o cargo de Promotor do MP-AM e continuar a exercer cargos diversos, o que até bem pouco tempo atrás era inimaginável. Outros, depois de nomeados, saíram do MP-AM para exercerem cargos na esfera federal. Essa evasão se explica pela pouca movimentação da carreira.

 

" Ernesto Che Guevara certa vez disse que “se você treme de indignação toda vez que vê uma injustiça, então somos companheiros”. Parafraseando-o, diria que se você fica indignado com a corrupção, com descalabros administrativos, com a impunidade, com o coronelismo de barranco que ainda grassa no interior, diria que você tem vocação para a carreira ministerial. Se você é vocacionado e tem o sonho de ingressar no MP, persista, pois a porta do nosso concurso é estreita, mas alta o suficiente para entrar de cabeça erguida."
Promotor Flávio Silveira