PEC-37:Estado brasileiro não pode abrir mão do MP para investigar onde polícia não pode chegar, defende Cruz

  • Estado brasileiro não pode abrir mão do MP para investigar onde polícia não pode chegar, defende Cruz

     Promotores de Justiça de todo o país se mobilizam contra a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que limita o poder de investigação do Ministério Público (MP). Nesta quarta-feira (13), em entrevista ao CBN Manaus, o Procurador-Geral de Justiça do Amazonas, Francisco Cruz, que também é o chefe do Ministério Público Estadual, explicou como a PEC pode afetar o trabalho do MP.

     

    “Se aprovada a PEC, apenas as polícias terão exclusividade na investigação penal, ou seja, retira do MP a possibilidade de também investigar. Depois da Constituição de 1988, o MP adquiriu a prerrogativa de também poder investigar. Jamais presidir inquéritos! Às vezes, tenta-se passar para a sociedade, que o MP já tem muitos poderes e quer mais. Não é isso! O que nós queremos, também, é naquelas hipóteses, onde, pela qualidade do agente envolvido no crime, pela natureza da infração – normalmente os crimes cometidos pelas organizações criminosas (Orcrim), dificilmente a polícia tem como chegar. E o MP, em razão das garantias que seus membros possuem, como a vitaliciedade, a inamovibilidade, a irredutibilidade de vencimentos, possa ir mais fundo na questão!”  De acordo com Francisco Cruz, o MP não quer tirar da polícia a função de investigar, mas insiste em que também deva dispor dessa prerrogativa.

     “O que nós queremos é uma polícia forte, preparada, que dê resultados para a sociedade, mas o Estado brasileiro não pode abrir mão de uma instituição como o MP, para também colaborar com as investigações. O exemplo mais recente e cristalino desse poder do MP é caso do ‘mensalão’. Será que a Polícia Federal (PF) teria chegado às entranhas do poder, como o MP chegou? Já que o delegado é subordinado ao superintendente da Polícia Federal? Já que o superintendente é subordinado ao Ministro da Justiça? Não que sejamos mais do que os policias federais. Não é isso! São prerrogativas de função, que, por isso, insistimos na possibilidade do PM também poder investigar!”

     O Procurador-Geral reafirmou a condição de igualdade entre os três atores jurídicos envolvidos no processo. O juiz, o promotor e o advogado. “Tanto o advogado, quanto o MP e o Judiciário são funções essenciais à Justiça. Não há relação de subordinação. Tanto o juiz, quanto o advogado, quanto o Promotor são agentes, atores do processo que funcionam na prestação jurisdicional. Não há chefe! O juiz não é mais que o advogado; o advogado não é mais que o Promotor; o Promotor não é mais que o delegado, o delegado não é mais do que o advogado. São agentes do processo, de igual hierarquia, cada um com sua tarefa delimitada pela Lei.”

     Francisco Cruz listou os crimes que podem ser objeto das investigações do MP e admitiu limites para as investigações do MP. “Queremos limites, sim, para investigar. Não queremos poder absoluto, como ninguém, neste país, pode ter poder absoluto. Pretendemos que o Supremo Tribunal Federal (STF) diga que nosso poder de investigar é constitucional, e que o legislativo nos dê as balizas e os limites. Nós queremos limites, sim. O MP não pode chegar e investigar qualquer questão! Defendemos que o MP possa investigar, por exemplo, o crime organizado, o crime de sonegação fiscal, fraudes em concursos públicos, quer dizer, o que pretendemos é colocar mais essa ferramenta a disposição da sociedade.”

     O Procurador-Geral comentou sobre a crise no sistema prisional. “É preocupante! A situação nos presídios – não é segredo para ninguém – não está boa nem aqui, nem em lugar nenhum. E é até natural, porque o ser humano nasceu para viver em liberdade e, a partir do momento em que ele é preso, essa prisão colide com esse sentimento natural de liberdade.”

     O procurador-geral condenou as regalias do sistema a criminosos condenados, no sistema prisional. “No Brasil, se transformou direito de preso em regalia. Confunde-se direito com regalia. A Constituição ‘fala’, seguidas vezes, em direito de preso, e, apenas uma única vez, em proteção das vítimas. Temos que compreender, e a sociedade precisa ter essa exata compreensão, de que, quem está na prisão, cometeu um crime, e prisão também é castigo! Quem cometeu crime, tem que sair do convívio da sociedade para pagar . Ela tem um caráter pedagógico, para inibir e o fundamento da ressocialização, então essa estória de  que preso fica reclamando  da qualidade de comida, isso cheira a deboche, porque o cidadão que não comete crime, às vezes não tem o que comer! E como é que pode preso ficar exigindo cardápio, melhor qualidade de comida. Ele não pode ser seviciado, agredido na sua integridade ou violentado nos seus direitos, por que o preso condenado perde apenas o direito de ir e vir, agora, entre isso, e ficar jogando comida fora, a pretexto de que está com fadiga daquele cardápio, isso é inadmissível.”

    O Procurador defendeu o uso de tornozeleiras para maior controle dos detentos e a criação de colônias penais, onde os presos cumpram suas penas trabalhando. “Eu defendo, inclusive que o preso deva trabalhar obrigatoriamente para ressarcir o dano do crime praticado e custear suas despesas no presídio.”  Cruz criticou o regime de progressão no sistema prisional brasileiro. “Sempre defendi isso. Acho que o regime brasileiro de progressão é equivocado. Se o cidadão é condenado a 10 anos, tem de cumprir 10 anos. Ah, mas ele teve bom comportamento. Sim, ainda poderia ter mau comportamento? O cidadão que comete um latrocínio, um homicídio, ainda é premiado pelo bom comportamento. Não! Lá não é colônia de férias, não! É local para reparar crimes. Se tiver bom comportamento, não é mais do obrigação dele! E se ele não tiver bom comportamento, essa pena vai ser exasperada, de modo que ele não possa esquecer sua conduta de malfeitor.”

     

     * Entrevista concedida à Rádio CBN Manaus, no último dia 13 de abril.